A pandemia de coronavírus tomou o mundo de assalto, atingindo mais de 180 países. Eventos foram cancelados ou adiados, inclusive os Jogos olímpicos de Tóquio, o comércio fechou, as pessoas estão dentro de casa em quarentena e as empresas estão tendo grandes prejuízos.
As indústrias de bebidas, entre outros setores, tiveram perdas no mundo inteiro, e a razão é bastante simples. Com as autoridades em vários países desencorajando ou até proibindo aglomerações, o que inclui festas, shows e a abertura de bares e casas noturnas, o estímulo ao consumo de bebidas alcoólicas é muito menor.
Como a cerveja Corona foi prejudicada pela crise do coronavirus.
A Cervejaria Corona informou que teve um prejuízo de 170 milhões de dólares. Controlada pelo grupo Imbev, que também controla a brasileira Ambev, a Corona é a terceira marca de cerveja mais consumida dos Estados Unidos. Segundo eles uma das razões para o prejuízo foi a não concretização das vendas previstas no mercado chinês, justamente o primeiro que foi afetado.
A Corona teve, como marca, um azar fenomenal, pois seu nome acabou sendo associado, indevidamente, não custa lembrar, ao do vírus que provoca a epidemia. Criada em 1925 no México, ele se refere à coroa solar, e não tem absolutamente nada e ver com o coronavírus. Mas, infelizmente, a associação pegou.
Como você pode ver no gráfico abaixo, as buscas no Google pelo recém criado termo corona beer vírus dispararam nos Estados Unidos, assim como uma série de memes bem-humorados, brincando com a coincidência. Isso deveria ter acendido o alerta de que algumas coisas deveriam ter sido feitas com mais cautela na gestão da marca. Mas se alguém fez o alerta, essa pessoa foi ignorada.
A Constellation Brands, empresa licenciada para distribuir a Corona nos Estados Unidos afirmou que seus consumidores entendem perfeitamente que não há ligação entre o vírus e o nosso negócio. E mais do que isso, manteve inalterada a campanha de lançamento da nova bebida da marca, a Corona Hard Seltzer. A campanha, com o slogan “coming ashore soon”, que em uma tradução livre para o português seria algo como “chegando em breve”.
Quando foi questionada a respeito da óbvia associação que poderia ser feita com a chegada da pandemia de coronavirus aos Estados Unidos, a porta-voz da Constellation Brands afirmou as vendas da Corona continuam altas e agradecemos o apoio contínuo de nossos fãs e nossa publicidade com a Corona é consistente com a campanha que realizamos nos últimos 30 anos e é baseada em fortes sentimentos do consumidor.
Mas a realidade desmentiu as declarações. A Corona lançou um tweet patrocinado com a frase chegando em breve e muita gente fez a associação com a iminente chegada da pandemia aos Estados Unidos. Eo público não perdoou. Varios replies do tweet consideraram o anúncio de mau gosto, e recomendavam que a marca se recolhesse por algumas semanas.
Pesquisas realizadas em seguida comprovaram o buzz negativo sobre a marca. A pesquisa da 5W Relações Públicas, feita com 737 consumidores de cerveja nos Estados Unidos indicava que 38% deles não compraria a marca sob nenhuma circunstância, por causa da epidemia, e 14% deles não pediria Corona em público.
Outra pesquisa, realizada pela You.Gov afirmou que a intenção de compra da Corona pelos consumidores americanos caiu ao seu nível mais baixo em dois anos, e que o Corona buzz score, que mede o quanto os comentários sobre a marca são favoráveis, caiu de forma significante desde o início de 2020.
O CEO da Constellation Brands, Bill Newlands, afirmou que as pesquisas não refletiam o desempenho da Corona em vendas, e chamou desinformação sobre o efeito da pandemia de coronavírus nos negócios da empresa de “extremamente infeliz”.
A crise de imagem passará, como mostra o declínio das buscas pelo termo corona beer virus. E os resultados financeiros ruins não ficarao tão evidentes em um momento em que muitas empresas, não só so setor de cervejas apresentam preejuízos. Mas isso não significa que erros não tenham sido cometidos.
Porque a Cerveja Corona criou uma crise para a sua marca
Apesar das negativas dos executivos da Constellation Brands, a Corona entrou em uma crise de imagem e cometeu diversos erros, tanto por ação como por omissão. E eles poderiam ter sido evitados ou minimizados, independentemente do azar de ser uma marca quase homônima da epidemia. Vamos analisar os principais deles:
A cerveja Corona subestimou o poder da associação dos nomes.
A associação entre coronavirus e Cerveja Corona, que gerou o termo corona beer vírus provavelmente nasceu de uma brincadeira, pois não existe uma razão racional para qualquer pessoa associar uma marca de cervejas que existe há 95 anos a uma epidemia que acabou de surgir.
Entretanto, ela aconteceu, e a empresa deveria ter levado em conta os danos que ela poderia ter sobre a marca. Não a ignorado e continuado a agir como se nada estivesse acontecendo.
A cerveja Corona subestimou as emoções e sentimentos causados pela epidemia de Covid-19.
A Constellation afirmou que a campanha era condizente com a estratégia da Corona para as últimas décadas, e era baseada nos sentimentos do consumidor. Pois foram justamente os sentimentos de medo, ansiedade e empatia do público que a Corona não soube avaliar e responder.
- Medo, porque não houve, nos últimos 100 anos pelo menos, nenhuma epidemia que fosse tão “globalizada”, atingindo tantas pessoas, em tantos países, quase ao mesmo tempo. E as notícias de infectados, mortos e pessoas em quarentena obrigatória, na época, somente na China, eram realmente assustadoras.
- Ansiedade, porque além do temor de a epidemia chegar ao país que o público americano sentia, vinham mais informações sobre a doença. E o fato de o Covid-19 ter o “requinte de crueldade” de uma pessoa infectada não apresentar sintomas, mas poder transmitir o vírus para outras pessoas, que ficarão doentes, só aumentava a ansiedade das pessoas.
- Empatia. Não acredito que ao utilizar a frase coming ashore soon, (chegando em breve) os profissionais que criaram a campanha quisessem fazer qualquer alusão à iminente chegada da pandemia aos Estados Unidos, utilizando a associação que já era feita. Mas uma parte do público entendeu de outra maneira. Pessoas brincando com a associação dos nomes, mesmo que as brincadeiras sejam de gosto duvidoso, é uma coisa. Marcas fazerem isso é bem diferente.
A cerveja Corona subestimou as redes sociais e a maneira que as pessoas expressam suas emoções nelas.
Quem utiliza redes sociais precisa entender que se trata basicamente de tentar provocar nas pessoas emoções e sentimentos, aos quais elas reagirão curtindo, compartilhando o conteúdo e comentando.
Mas, se a emoção provocada não for a correta, a reação, o engajamento criado não será aquele que a marca deseja. No caso da cerveja Corona, a impressão causada foi a de uma espécie de “brincadeira” com infectados e mortos nos países onde a pandemia de coronavirus já havia chegado. E com o medo e ansiedade dos que viviam onde ela inevitavelmente chegaria. A reação das pessoas obviamente foi negativa.
E outra característica das redes sociais é que elas são instantâneas, favorecem a espontaneidade e um comportamento de grupo, que alguns chamam de “manada”. Nesse caso específico, a partir do momento em que uma pessoa percebeu a associação, mesmo que involuntária, e fez o comentário crítico, muitas outras se sentiram estimuladas e “autorizadas” a fazer o mesmo, gerando o buzz negativo que a Corona enfrentou.
Resumindo, a Corona apostou na premissa, verdadeira, de que racionalmente as pessoas sabem que não há relação entre a cerveja e a pandemia. Mas errou ao subestimar a maneira como as emoções e os sentimentos podem influenciar o comportamento das pessoas, mesmo contra o que seria uma conclusão racional.
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Como outras marcas reagiram à crise do coronavirus
Não haveria como, nesse post, fazer uma análise de como como centenas, milhares de empresas estão agindo durante a crise do coronavirus. No geral, a grande maioria parece ter entendido a gravidade da situação, e tendo uma atitude genuína de colaboração, fazendo o que estiver ao seu alcance para combater a pandemia.
Algumas, como a Ambev, produziram gratuitamente álcool 70 para doar a hospitais públicos. Outras, fizeram ações de conscientização para o público externo e deram o exemplo, colocando voluntariamente seus colaboradores em sistema de trabalho home office ,para facilitar a quarentena.
Em relação à maneira que as marcas se posicionam, a atitude geral parece ser de muita cautela antes de qualquer ação, no que estão corretas. Não só porque a situação em si é muito delicada, como qualquer ação de comunicação que seja mal interpretada encontrará o público que já está mais nervoso e ansioso que o normal, por causa da quarentena e de toda a ansiedade que a situação provoca. E conectado às redes sociais.
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