A morte de Ozzy Osbourne, em 22 de julho de 2025, aos 76 anos, comoveu o mundo. 15 dias antes, em 5 de julho, ele havia se despedido dos palcos no estádio do Aston Villa, em Birmingham, cidade da Inglaterra onde ele começou a carreira, com um show com a formação original do Black Sabbath e de vários artistas que ele influenciou, como Guns’ n” Roses, Metallica e Pantera. Mas, por que ele era essa figura lendária, cuja fama ultrapassou as fronteiras do Heavy Metal, do Rock e até da música em si? Nesse artigo falaremos sobre a estratégia de marketing de Ozzy Osbourne como um produto cultural, que ensina às marcas lições para sobreviver ao teste do tempo.
O início da carreira de Ozzy Osbourne com o Black Sabbath.
A carreira de Ozzy começou no final dos anos 1960, quando ele se juntou a Tony Iommi (guitarra), Geezer Butler (baixo) e Bill Ward (bateria) para formar o Polka Tulk Blues Band, que depois mudou de nome para Earth. Mas como já existia uma banda com esse nome, eles escolheram o título de uma de suas canções Black Sabbath.
A origem do nome Black Sabbath
A sugestão para o nome Black Sabbath veio de Geezer Butler, que era o principal letrista da banda. Ele foi inspirado em um filme de terror de 1963, do diretor italiano Mario Brava, chamado “I Tre Volti Della Paura” , As Três Máscaras do Terror, que foi exibido no Estados Unidos e Reino Unido com o nome de Black Sabbath, e que trazia em seu elenco, entre outros, Boris Karloff.
A estratégia de Marketing de Ozzy Osbourne nasceu do posicionamento da marca Black Sabbath
Para entender a estratégia de marketing de Ozzy Osbourne, que foi muito bem pensada e planejada, e não surgiu de uma forma orgânica, mas foi muito bem pensada, planejada e executada, um mérito de sua empresária, Sharon Arden, que depois viria a se tornar sua esposa, adotando o sobrenome do marido, Sharon Osbourne, é preciso entender qual era o posicionamento da marca Black Sabbath, que até onde sabemos, não foi planejado, surgindo organicamente, um produto da inspiração artística de Tony Iommi, Geezer Butler, Bill Ward e Ozzy Osbourne.
Produtos culturais têm sucesso de forma orgânica se aparecem na hora e no lugar certo. Eles atraem as pessoas e as encantam porque trazem algo que elas sentem que necessitam, mesmo que, racionalmente, não saibam, ou admitam isso.
Porque o primeiro disco do Black Sabbath foi uma revolução. E Ozzy Osbourne participou dela!
Para entender por que o primeiro disco do Black Sabbath foi uma revolução, e é considerado o marco zero do Heavy Metal, apesar do próprio Ozzy nunca ter gostado muito desse termo, e não se considerar a parte dele, musicalmente, é preciso entender que ele mudou tudo em termos de conteúdo, das letras, e da estética, tanto musical quanto visual. E para isso, é preciso entender o que havia antes.
Anos 60, movimento hippie e psicodelia.
Os anos 60 foram o momento da contracultura, do amor livre, da psicodelia e do auge criativo dos Beatles, Rolling Stones, Jimi Hendrix, Janis Joplin e The Doors, entre outros. Do ponto de vista comportamental, foi a época da liberação feminina, com a minissaia e a pílula anticoncepcional abrindo caminho para a revolução sexual, conceitos que após algum choque, se tornaram socialmente aceitos a ponto de uma grande corporação usar uma estratégia de marketing de conteúdo como o Calendário Pirelli, mostrando imagens sensuais de mulheres e isso ser considerado ousado, mas não ofensivo. Muito pelo contrário! Uma forma de arte elegante e sofisticada!
Ao mesmo tempo, nos anos sessenta, os Estados Unidos e o Reino Unido passavam por um momento de grande crescimento econômico, o que fez dos anos sessenta uma época de otimismo.
The Dream is Over.
Após uma década em que o movimento hippie atingiu o seu auge, no chamado “verão do amor” em 1967, o estado de espírito no mundo começou a mudar e o sentimento de otimismo começou a desaparecer. A Guerra do Vietnã continuava, e se tornava mais brutal, líderes inspiradores, como Martin Luther King, John Kennedy e seu irmão Robert eram assassinados. O Festival de Altamont, que pretendia ser um novo Woodstock, entrou para a história pelos episódios de violência, sendo o mais notório o assassinato do jovem afro-americano Meredith Hunter por um membro da gangue de motoqueiros Hell´s Angels, que havia sido contratada para fazer a segurança do evento.
Música falando sobre paz e amor parecia não fazer mais sentido.
Nesse contexto, outras bandas inglesas, como o Cream, Led Zepellin e Deep Purple já faziam uma música mais pesada e se afastavam da psicodelia, mas foi o primeiro disco do Black Sabbath que mudou o jogo, trazendo uma abordagem sombria, pesada e aterrorizante, que ninguém fazia antes, no aspecto musical, lírico e visual.
Começando pelo musical, a faixa título do álbum homônimo, Black Sabbath, era altamente impactante, com o som de uma tempestade, sinos e um riff baseado no intervalo de trítono, arrastado e pesado, muito pesado. Mais pesado que qualquer coisa que o mundo já tinha ouvido. Antes de ser intencional, esse som era resultado de uma limitação física de Tony Iommi, que havia perdido as pontas de dois dedos em um acidente em uma metalúrgica,e passou a afinar sua guitarra em tons mais baixos para aliviar a tensão nas mãos, criando o som mais grave e sombrio que o tornaria um dos músicos mais influentes da história do Rock.
Se a parte musical era assustadora, a parte lírica não deixava por menos, como mostra a letra de Black Sabbath.
What is this that stands before me?
Figure in black, which points at me
Turn ‘round quick, and start to run
Find out I’m the chosen one
Oh, no!
Big black shape with eyes of fire
Telling people their desire
Satan’s sitting there, he’s smiling
Watches those flames get higher and higher
Oh, no, no, please, God help me
Is it the end, my friend?
Satan’s coming ‘round the bend
People running ‘cause they’re scared
The people better go and beware!
No, no, oh, God, no!
A parte visual acompanhava a lírica e musical. A capa do disco Black Sabbath mostrava uma bruxa em frente a uma mansão com ar de abandono e decadência. A foto, feita por Keith McMillan, mostrava a modelo Louisa Livingstone, vestindo apenas uma capa preta, em frente ao moinho Mapledurham, uma construção do século XV localizada em Oxfordshire.
Para conseguir o efeito desolador e sombrio que essa imagem tem até hoje, McMillan fotografou com o filme Kodak Aerochrome, especial para fotografias aéreas, conseguindo um aspecto mais avermelhado ao tom verde da vegetação. A imagem granulada e indefinida era resultado de um processo em que o filme era fervido, e depois congelado.
Black Sabbath: desprezados pelos críticos, amados pelo público.
Hoje o Black Sabbath é reconhecido como um clássico absoluto, e sua influência é tão grande e abrangente que é até difícil de ser mensurada. Mas esse reconhecimento só veio décadas depois, quando sua música já havia superado o teste do tempo. No início, a crítica especializada desceu a lenha na banda. Lester Bangs, na lendária revista Rolling Stone chamou a temática ocultista das letras de “farsa” e a música de inábil, derivada e sem substância, resumindo o Sabbath como uma banda “Igual ao Cream! Mas pior”. Outros artistas, como o baixista do Pink Floyd, Roger Waters, também se mostravam pouco impressionados.
Mas o público simplesmente tinha outra opinião, e se apaixonou pelo quarteto de Birmingham, fazendo de seu primeiro álbum um grande sucesso, que até hoje vendeu milhões de cópias, assim como os álbuns seguintes. Além de ultrapassar a marca de 100 milhões de discos vendidos, o Black Sabbath estabeleceu as bases musicais e a própria identidade de um novo gênero musical dentro do Rock n Roll: o Heavy Metal. E mesmo que esse gênero tenha se subdividido em diversos subgêneros, a influência de Ozzy Osbourne, Tony Iommi, Geezer Butler e Bill Ward em todos eles é indiscutível.
Quantos discos o Black Sabbath vendeu na década de 70
Black Sabbath – 4,9 milhões
Paranoid – 9,9 milhões
Master of Reality – 4,8 milhões
Vol. 4 – 4,1 milhões
Sabbath Bloody Sabbath – 4 milhões
Sabotage – 2,6 milhões
We Sold Our Soul For Rock ‘n’ Roll – 4,1 milhões
Technical Ecstasy – 1,5 milhões
Never Say Die! – 1,4 milhões
O Black Sabbath era ocultista?
Não existe nenhum registro ou testemunho de que Ozzy Osbourne, Tony Iommi, Geezer Butler ou Bill Ward tenham participado de rituais, se juntado a seitas, ou nada nesse sentido. Então, há segurança suficiente para se afirmar que não, os membros do Black Sabbath não eram ocultistas, embora muita gente provavelmente acreditasse que eles eram.
Essa percepção nasceu do conteúdo das letras, que tratava de temas como ocultismo. Mas também de ficção científica e fantasia (Iron Man), política e pacifismo (War Pigs e Children of The Grave) e até ambientalismo (Hole in The Sky). Livros e filmes sobre esses temas eram a inspiração para Geezer Butler, o principal letrista da banda. E dado que essa temática fez a banda se destacar, posicionou a marca, e agradou ao público, era natural que a fórmula fosse repetida.
Mas não custa lembrar que After Forever tem uma letra de inspiração abertamente cristã, e Ozzy Osbourne repetia diversas vezes nos shows, tanto do Sabbath, como de sua carreira solo, seu icônico bordão God Bless You All! (Deus abençoe a todos!)
Se a imagem de ocultista, com as roupas pretas e as cruzes eram apenas uma persona artística, isso não quer dizer que eles fossem um exemplo a ser seguido. Se hoje o bom-mocismo faz parte do posicionamento de muitos popstars, na década de 70 isso era raríssimo. Todos, ou quase todos, eram o que podemos chamar de muito loucos, especialmente sob o efeito de substâncias, legais ou ilegais.
Go Crazy!
Se “meter o pé na jaca” era praticamente um código de comportamento da época, ninguém fazia isso como Ozzy Osbourne. E se fez, não permaneceu muito tempo entre nós, para contar a história. No palco, Ozzy foi um dos maiores “showman” que já existiram pulando, se contorcendo, interagindo com o público e usando de seu inigualável carisma para levantar a plateia com um simples olhar, ou uma careta. Já nos bastidores, usava e abusava de álcool e outras substâncias de uma maneira que era excessiva até para as expectativas que as pessoas tinham sobre um rockstar “muito louco” e “descontrolado”. Em outras palavras, Ozzy era o “Madman”.
A força da figura do Madman na estratégia de marketing
Ozzy Osbourne não foi o primeiro rockstar que fez de uma vida de excessos, destrutivos e autodestrutivos, sexuais, etílicos ou químicos, com todo o efeito que isso pode ter no comportamento de alguém, um espetáculo para o público acompanhar. Alguns episódios se tornaram lendários, como as diversas passagens dos Rolling Stones pela prisão, as festas que o Led Zeppelin fazia acompanhado de muitas fãs nos quartos de hotel, que terminavam inevitavelmente destruídos e o carro jogado em uma piscina de hotel, além dos vasos sanitários dos banheiros de hotel literalmente explodindo, com os fogos de artifício e outros explosivos que o baterista do The Who, Keith Moon, levava consigo nas turnês.
Qualquer pessoa normal que fizesse isso seria considerada louca, ou simplesmente idiota, já que passaria um bom tempo na cadeia, além de ter de cobrir o prejuízo. Mas as gravadoras e empresários dessas bandas jamais pensaram em demiti-las por causa disso. Além de pagar pelos bens danificados, ainda pagavam pelos advogados, acionados sempre que as coisas passavam dos limites.
E elas não faziam isso por força contratual, bondade, ou amizade com os artistas. Todas essas despesas acabavam sendo um investimento em marketing, porque gerava mídia espontânea, e principalmente, porque o público simplesmente amava isso!
Artistas famosos não somente gozavam de uma liberdade extrema, com o público esperando que eles quebrassem as regras, e não vivessem uma vida comum, como as pessoas canalizavam neles suas fantasias de rebeldia e autenticidade, de poder viver sem prestar contas por seus desejos, falas e ações.
Obviamente isso é uma ilusão, porque toda ação tem consequências, e não se pode fugir delas para sempre, por mais fama ou dinheiro que se tenha. E muitos rockstars sucumbiram a isso. Mas o mito romântico de que a dor gera arte, e que grandes obras vêm de almas atormentadas, de que os excessos são parte do “preço da genialidade”, ajudou a criar imagem de muitos artistas ao longo dos séculos, como por exemplo, de Mozart, retratado como um rebelde que vivia uma vida de excessos no filme “Amadeus”, de 1985.
Figuras carismáticas, que não seguem as regras, desafiando a moral vigente, constroem uma imagem, um posicionamento de marca, que se torna tão interessante para o público quanto o produto que eles efetivamente entregam, a arte e o entretenimento.
A demissão do Black Sabbath
Ser um rockstar que não escondia de ninguém seu comportamento autodestrutivo chamava a atenção da imprensa e fidelizava o público. Mas essa não é uma profissão tão diferente assim das outras, no sentido de quem não está em boas condições físicas e mentais não consegue realizar bem o seu trabalho, que não inclui somente compor e executar suas músicas, mas exaustivas turnês de divulgação, que incluem shows com 2 horas de duração e longas viagens, onde aconteciam ainda mais excessos.
Essa rotina pode parecer glamourosa para o público, mas é física e mentalmente desgastante, além de impor um intenso convívio entre todos os profissionais, onde as diferenças pessoais se tornam mais evidentes e os egos exacerbados se chocam. Um ambiente que, se não for bem gerenciado, implode qualquer relacionamento profissional ou até de amizade.
Um cantor, especificamente, precisa ter sua garganta e forma e sua voz preservada, se cuidando da mesma maneira que um atleta de alto rendimento. Cuidar de sua saúde física e mental era algo que Ozzy Osbourne decididamente não fazia, e em 1979 foi expulso do Black Sabbath, sendo substituído por Ronnie James Dio, iniciando uma das rivalidades mais famosas e duradouras da história do Show Business.
A estratégia de marketing da carreira solo de Ozzy Osbourne
Quando foi demitido do Black Sabbath, Ozzy Osbourne praticamente entrou em depressão. Mas foi resgatado dela por Sharon Arden, filha do empresário do Black Sabbath, Don Arden. Sharon havia aprendido tudo sobre o negócio de gerenciar uma banda de rock com seu pai, mas acabou se desentendendo com ele, que já tinha uma reputação de ser pouco ético nos negócios. Apesar de já ter empresariado grandes nomes do rock, como o Jerry Lee Lewis, Little Richard, Gene Vincent e Small Faces, Don Arden tinha a fama de ter métodos de ação “mafiosos”, que lhe renderam o nada honroso apelido de “Al Capone do Rock”.
Sharon Osbourne, empresária e esposa
Rompida com o pai, Sharon enxergou além da situação decadente que Ozzy estava naquele momento. Enxergou no talento e carisma que acompanhavam aquele comportamento autodestrutivo, um produto cultural de sucesso que capturaria todo o espírito dos anos 80, a década do exagero.
Empresária tão habilidosa quanto seu pai, Sharon era exímia em negociar contratos, e sabia ser muito dura, implacável até, quando o objetivo era defender os interesses de Ozzy. E ela não precisava se preocupar em criar situações que fossem notícia, para cavar espaço na imprensa, porque Ozzy fazia isso sozinho. E aquilo que para qualquer outra pessoa seriam crises de imagem, para Ozzy era a construção de uma marca que se tornaria sinônimo de rebeldia e desafio às convenções estabelecidas. E que Sharon saberia usar muito bem.
A relação profissional rapidamente evoluiu para uma relação pessoal, e em 4 de julho de 1982 eles se casaram. E permaneceram casados até o falecimento de Ozzy, tendo 3 filhos: Aimee, Kelly e Jack.
Ozzy Osbourne, o Príncipe das Trevas
Se a década de oitenta hoje é chamada de década do exagero, Ozzy Osbourne se adaptou perfeitamente à mudança dos tempos, o que pode ser difícil para muitos artistas. Pense em quantas vezes você já não viu ou ouviu artistas que fizeram muito sucesso no passado tentarem se adaptar às novas tendências de mercado e simplesmente não convencerem ninguém, soando tão forçados e artificiais que perdem os fãs que restavam sem conquistar novos, perdendo sua relevância?
Não foi o caso de Ozzy Osbourne. Aliás, ele teve sua grande contribuição para os anos oitenta serem a década do exagero. Além de adotar o visual “glam” que era comum em bandas que faziam sucesso na época, tudo o que o Ozzy fazia era extremamente exagerado, inclusive as polêmicas e o comportamento autodestrutivo, que se tornaram parte de sua persona como um artista solo.
As polêmicas de Ozzy Osbourne
As polêmicas de Ozzy Osbourne são parte integrante da estratégia de marketing que permitiu que ele se tornasse um artista ainda mais relevante nos anos oitenta. Aliás, não são poucas as pessoas que naquela época entendiam que ele representava melhor o espírito do Black Sabbath do que sua ex-banda, que apesar da liderança de Tony Iommi , que Ozzy sempre respeitou apesar de tudo, trocava constantemente de formação, perdia sua identidade frente ao público e diluía a força de sua marca.
Ozzy, por outro lado, reuniu uma banda com grandes músicos, sendo o mais notório deles o guitarrista Randy Rhoads, que depois de gravar os álbuns Blizzard of Ozz e Diary of a Madman, faleceu em um trágico acidente aéreo, em 1982. A qualidade musical, somada ao carisma e à presença de palco únicos já seriam uma combinação poderosa. Somados às polêmicas que mantinham o nome de Ozzy sempre em evidência, que a habilidade de Sharon sabia explorar muito bem, criaram um produto e uma marca únicos na indústria de cultura e entretenimento.
Mas vamos falar de algumas das principais polêmicas e gafes de Ozzy Osbourne.
Arrancar a cabeça de uma pomba com os dentes
Ozzy conta que estava no prédio da CBS Records para uma reunião em 1981, muito alcoolizado e. Sharon pediu que ele entrasse na sala de reunião e soltasse duas pombas brancas em sinal de paz. Mas, completamente fora de si, ele jogou uma para cima e arrancou a cabeça da outra com os dentes, jogando-a em cima da mesa. A notícia rapidamente se espalhou pelo mundo inteiro, e Ozzy foi expulso do prédio. Mas o fato entrou para a lista de lendas que cercavam o “Príncipe das Trevas”, e ajudou a construir a marca que os fãs, pelos motivos certos ou errados, amavam.
Ozzy Osbourne mordeu a Cabeça de um Morcego
Esse talvez seja o momento mais bizarro da carreira de Ozzy Osbourne. E isso não é pouca coisa. Em 1982, durante um show em Des Moines, Iowa, um fã jogou um morcego no palco. Ozzy achou que era um brinquedo de borracha e mordeu a cabeça do animal, só aí descobrindo que era um morcego de verdade.
Além de exames e vacinas contra a raiva, Ozzy recebeu milhares de críticas, tanto inclusive de grupos de proteção dos animais, e o assunto ocupou as manchetes em vários países do mundo. Algumas pessoas detestavam Ozzy Osbourne. Chegavam a ter medo dele, considerando-o um mau exemplo para a juventude, e até uma ameaça à sociedade. Outras tantas o amavam pelo que a sua figura significava, e pela sua música. Mas era muito difícil ficar indiferente a ele.
Processos Judiciais por acusações de Mensagens Subliminares
A acusação de estar envolvido com ocultismo perseguia Ozzy Osbourne desde os tempos com o Black Sabbath, e seu estilo de vida excêntrico, e a imagem de “Príncipe das Trevas” contribuíam para isso de certa maneira, mas é absolutamente injusto atribuir sua fama somente a essas polêmicas, já que ele produzia músicas que conquistaram diversas gerações.
Mas foi uma delas, Suicide Solution, que levou Ozzy aos tribunais, em uma época em que os EUA viviam uma espécie de pânico em relação a isso. A letra relatava o drama de um alcoólatra, e foi escrita após a morte de Bon Scott, primeiro vocalista da banda australiana AC/DC, que aconteceu por causa do abuso de álcool, e relata todos os problemas que essa dependência química, traz à vida de uma pessoa. Era um alerta para que elas tomassem cuidado.
Mas quando John Daniel McCollum, de 19 anos, cometeu suicídio, em 26 de outubro de 1984, seus pais, Jack McCollum e Geraldine Lugenbuehl, acusaram Ozzy de incentivar o ato através da música, e em 1986 iniciaram um processo judicial contra ele e a gravadora CBS Records.
O processo foi arquivado em 1988, com a justiça decidindo que o suicídio de McCollum não foi uma consequência previsível de ter escutado a canção, e a justiça também concluiu que não havia mensagens subliminares nas músicas.
Mas o caso atraiu enorme atenção da mídia, tornando Ozzy uma espécie de vilão que uma parcela do público odiava e rejeitava por ser barulhento, esquisito, excêntrico, desafiador e até mesmo ligado ao “oculto”. Ao mesmo tempo em que havia protestos contra ele, banimento de rádios e outras polêmicas, ouvir suas músicas era uma atitude de rebeldia e liberdade, eram parte de um estilo de vida, o que aumentava ainda mais a sua visibilidade, e o tornava cada vez mais amado por outra parcela do público.
Urinar no Forte Álamo
As ruínas do Forte Álamo são um dos mais importantes monumentos históricos da cidade de San Antonio, no Texas. Lá, tropas lideradas por David Crockett e James Bowie lutaram até a morte contra as tropas mexicanas, lideradas pelo General Santa Anna, acabando derrotadas, mas se tornando um dos mitos inspiradores da Guerra de Independência do Texas.
Pois bem, certa noite, após um show na cidade, Ozzy estava tão bêbado que Sharon escondeu suas roupas para impedir que ele saísse alcoolizado. Mas ele pegou as roupas da esposa e saiu. E foi justamente quando ele estava nesse estado, de vestido, que teve a ideia de urinar no primeiro muro que encontrou. Justamente o do Forte Álamo. O ato foi considerado extremamente ofensivo ,e Ozzy foi preso e banido de San Antonio até1992, quando fez um pedido público de desculpas.
Prisões
Ozzy seria preso mais uma vez, em Menphis, por estar embriagado em público, mas nem todas as suas visitas à cadeia, quase sempre ocasionadas por abusos de substâncias, foram por motivos, digamos, “folclóricos”. Em 2 de setembro de 1989, em um surto psicótico quando estava alcoolizado, Ozzy Osbourne tentou estrangular Sharon, que conseguiu se libertar e chamou a polícia. Ozzy acordou na cadeia no dia seguinte, sem se lembrar do que tinha acontecido. Sharon retirou a acusação.
Internações
Ozzy foi muito lembrado pelos seus problemas de saúde no fim da vida, mas poucos se lembram de quando ele foi internado para desintoxicação na famosa Clínica Betty Ford, e que Sharon só o convenceu a ir até lá porque disse que lá eles iam ensiná-lo a beber e usar substâncias da maneira correta.
Mostrar uma bandeira do Brasil… em um show na Argentina
A rivalidade continental entre Brasil e Argentina já foi quase motivo de guerras no passado. Mas hoje é motivo de piadas. E Ozzy participou de uma delas, sem querer. Se apresentando com o Black Sabbath na Argentina, na cidade de La Plata no dia 6 de outubro de 2013, Ozzy causou a revolta da plateia ao aparecer envolto em uma bandeira do Brasil, durante a música “Dirty Women”. Poucos dias depois, no Brasil, Ozzy Osbourne admitiu que tinha cometido “um erro mundial” .
Ozzy obviamente não sabia qual era a bandeira do Brasil, e da Argentina, e o deslize provocou vaias da plateia, mas não o suficiente para diminuir a qualidade do show do Black Sabbath, que foi aplaudido.
Década de 90. O Heavy Metal perde a relevância, mas Ozzy não!
Se a década de 80 é considerada o auge do Heavy Metal, em que o estilo vendia muito, especialmente na sua vertente mais Glam, os anos 90 foram marcados pela saturação e o cansaço do grande público com esse estilo, que coincidiu com o surgimento do Grunge de Seattle, representado por bandas como Pearl Jam, Alice in Chains e principalmente o Nirvana. Todas elas assumiam uma grande influência do Black Sabbath, tinham peso, mas eram de um estilo diferente.
Bandas que fizeram muito sucesso até então, como o Metallica, tornaram o seu som mais acessível e palatável às rádios, e fizeram mais sucesso ainda. Mas muitas ligadas a um heavy metal mais old school, com muito peso e velocidade, e menos dados a concessões, não fizeram essa transição, e continuaram restritas ao nicho do metal, e suas inúmeras subdivisões.
O Black Album do Metallica foi lançado em 12 de agosto de 1991 e No More Tears, de Ozzy Osbourne, em 17 de setembro do mesmo ano. E ambos compartilham uma característica: O peso avassalador, os solos de guitarra ultra técnicos e na velocidade “da luz”, com letras cantadas no mesmo ritmo foram substituídos por uma versão mais “diluida”, e por isso, acessível ao grande público, que estava cansado dos exageros dos anos oitenta.
Da mesma maneira que o Black Album foi o maior sucesso comercial do Metallica, No More Tears foi o segundo maior de Ozzy Osbourne, permitindo que ele se mantivesse em evidência em um momento em que a maioria dos artistas que carregavam no seu posicionamento de marca o rótulo de “heavy metal” uma época de vacas magras.
Esse sucesso possibilitou o lançamento de um álbum ao vivo de grande repercussão, Live and Loud, de um novo de estúdio, com a participação do virtuoso guitarrista Steve Vai, embora a parceria não tenha dado tão certo assim, e de uma de suas maiores inovação comerciais, o OzzFest.
O OzzFest nasceu da recusa do Lollapalooza em contratar Ozzy Osbourne
Nos anos 90 o festival Lollapalooza popularizou a cultura dos festivais itinerantes como um produto cultural de sucesso. Criado pelo músico Perry Farrel para divulgar bandas alternativas, como o seu próprio Jane`s Addiction, os produtores nunca foram muito fãs do Heavy Metal, a ponto de, em 1996, Farrel abandonar a produção por não concordar com o Metallica, a banda mais popular dos anos 90, como atração principal.
Mas no geral, o festival não era muito fã de bandas de metal. E quando Sharon Osbourne ligou para os promotores do Lolla, sugerindo que eles contratassem Ozzy, eles a esnobaram dizendo que seu marido não era mais relevante. Mas Sharon nunca foi alguém que deva ser subestimada: Decidiu criar o seu próprio festival. E conseguiu.
Ozzfest – o festival do metal.
Se o metal estava em baixa nos anos 90, isso não quer dizer que o nicho de público que gosta do estilo tivesse desaparecido. Apenas precisava de seu próprio espaço. E foi isso que o OzzFest se tornou.
Entre1996, sua primeira edição, até 2018, a última presencial, sem contar a que foi feita virtualmente em 2022, ainda sob os efeitos da pandemia e isolamento social, o Ozzfest foi o palco mais prestigiado para a música pesada nos anos 1990 e 2000, recebendo grandes nomes do estilo, como próprio Black Sabbath, Slayer, Korn, Judas Priest, Motorhead, o brasileiros Sepultura e o Iron Maiden, embora Steve Harris, Bruce Dickinson e Cia provavelmente não tenham boas lembranças do OzzFest.
Não mexa com Sharon Osbourne
Lemmy Kilmister, baixista e vocal do Motorhead, era talvez o protótipo do “durão do Rock´n´Roll”. Mas ele uma vez afirmou: “nunca mexa com Sharon Osbourne. Não é conveniente provocá-la, pois não se trata de uma mulher normal. Ela é como um homem; capaz de tudo para destruir seus desafetos”.
Iron Maiden x Sharon Osbourne
No Ozzfest de 2005, por alguma razão o vocalista do Iron Maiden, Bruce Dickinson, teria feito comentários pouco lisonjeiros sobre Ozzy Osbourne durante suas apresentações, o que seria desrespeitoso com a pessoa que estava lhes pagando o cachê. A razão de Bruce ter falado tais coisas nunca ficou clara, mas em retaliação, Sharon mandou cortar o som do Iron Maiden repetidamente e encorajou pessoas do público a atirarem ovos na banda durante o show.
Ozzy no Brasil
O Ozzfezt, infelizmente, jamais passou pelo Brasil. Mas Ozzy Osbourne esteve aqui várias vezes: Em 1985, no primeiro Rock in Rio, em 1995, na segunda edição do Philips Monsters of Rock, em 2013, na turnê de reunião do Black Sabbath, e pela última vez em 2018, tocando no Allianz Parque.
The Osbournes – desconstruindo o Príncipe das Trevas.
Se durante 30 anos ter Ozzy Osbourne como uma figura ameaçadora tinha funcionado, talvez o próximo passo da estratégia de marketing de Ozzy Osbourne fosse descontruir a figura do “Príncipe das Trevas”. E foi justamente em um momento em que reality shows eram quase uma novidade, com o primeiro Big Brother sendo realizado na Holanda, em 1999, que surgiu a ideia de colocar câmeras dentro da casa da família Osbourne.
Em 5 de março de 2002 estreava na MTV americana The Osbournes, a série com mais espectadores de sua história. Ozzy já era uma celebridade mundialmente conhecida, e se tornou ainda mais conhecida. Mas de um jeito diferente. Ao invés do rockstar ensandecido que arrancava as cabeças de animais, e alguns talvez achassem que morava em um castelo mal assobrado, aparecia um pai de família confuso, lutando com a tecnologia e as tarefas do dia a dia. Mas muito amoroso com sua esposa, Sharon, e seus filhos Jack e Kelly. Aimee preferiu não se expor frente às câmeras.
O carisma natural de Ozzy tornava tudo muito engraçado, e além dele, Sharon, Jack e Kelly se tornaram celebridades conhecidas no mundo inteiro.
Alguns fãs mais radicais criticaram a desconstrução da persona pública do “Príncipe das Trevas”, mas o fato é que Ozzy era mais famoso do que nunca. E, ao contrário de muitas celebridades que se tornaram famosas na era das redes sociais, mas ninguém consegue explicar exatamente o que eles fazem para serem famosos, Ozzy acrescentava mais um capítulo a uma carreira de sucesso que já durava décadas, e tinha bons motivos para isso. E estava atingindo um novo público.
O fim da carreira de Ozzy Osbourne
Apesar das polêmicas e estratégias de marketing, a grande razão do sucesso de Ozzy Osbourne é que ele era um artista único. Fãs do aspecto mais técnico da música criticavam suas capacidades vocais, afirmando que outros vocalistas tinham um alcance vocal e uma afinação superiores às dele.
Isso até é verdade, mas o fato é que sua voz era única, e cheia de personalidade. E nenhuma canção que tivesse sido gravada originalmente por ele ficava melhor na voz de outra pessoa, por melhor que ela cantasse. E da mesma maneira, no palco ele talvez fosse insuperável, capaz de eletrizar uma plateia com uma careta ou um olhar.
O último show de Ozzy Osbourne
Não é exagero afirmar que o público amava Ozzy Osbourne, e a recíproca era verdadeira. E que se Ozzy pudesse escolher, provavelmente se despediria desse mundo em cima do palco, na frente de seus fãs, gritando “Go crazy” e “God Bless You All”. E ele quase conseguiu isso.
Seu último show, com ele já muito debilitado, ocorreu em em 5 de julho de 2025, em Birmingham, Inglaterra onde tudo começou. Chamado de Back to the Beginning, de volta ao começo, contou com a participação da formação original do Black Sabbath, inclusive do baterista Bill Ward, que havia ficado de fora da reunião de 2013, o que até hoje era motivo de discussões e polêmicas.
Acontecendo no estádio do Villa Park, a casa do Aston Villa, o show de despedida contou com diversos outros artistas como Metallica, Slayer, Pantera e Guns N’ Roses. Além deles, houve “jams” de artistas como Ronnie Wood (Rolling Stones), Travis Barker (Blink-182) e Tom Morello (Rage Against the Machine), Billy Corgan, vocalista do Smashing Pumpkins, KK Downing, do Judas Priest e Steven Tyler, do Aerosmith.
O evento foi um show beneficente que arrecadou fundos para instituições como a Cure Parkinson’s, o Birmingham Children’s Hospital e o Acorn Children’s Hospice.
A morte de Ozzy Osbourne
Apenas 15 dias após sua despedida definitiva, Ozzy Osbourne também se despediu desse mundo, falecendo aos 76 anos, em 22 de junho de 2025, de infarto agudo no miocárdio. Seu cortejo fúnebre foi seguido por milhares de fãs na cidade Birminghan, lugar onde ele se tornou um dos pais de um estilo musical, e de onde saiu para mudar a história da cultura pop, da indústria musical e do entretenimento.